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terça-feira, 15 de abril de 2014

Morre o surpreendente Eliseo Verón

Morreu hoje, em Buenos Aires, o filósofo e semiólogo Eliseo Verón, 78, em decorrência de um câncer. Esta triste notícia me fez lembrar não apenas dos muitos papers com sua assinatura que compõem minha biblioteca acadêmica, mas principalmente do contato que tive com este ícone  intelectual latino-americano durante o Celacom 2007. 

Na época eu era graduanda do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da UCPel. Como avaliação à disciplina de jornalismo digital (acho eu), a professora Raquel Recuero propôs à minha turma de 7o semestre que nos dividíssemos em grupos e realizássemos a cobertura on-line do Celacom. Essa tarefa foi, certamente, a experiência mais enriquecedora que tive durante os quatro anos do curso de jornalismo. 

Em função do trabalho proposto, produzi algumas matérias, charges e crônicas, entre elas uma que tratava, especificamente, do maior homenageado daquela edição do Celacom, Eliseo Verón. Lembro que na época fiquei nervosa por não conhecer em profundidade o trabalho do autor, mas me propus a observa-lo durante os três dia de colóquio para compor uma crônica que, ao contrário das muitas matérias já publicadas pelos alunos, não tratava do trabalho intelectual do professor argentino, mas sim de sua surpreendente figura. 

Hoje, presto minha pequena homenagem àquele que veio a se tornar um de meus ícones no universo acadêmico, (re)publicando a crônica escrita em 2007: 


Teoria x Práxis 
(crônica publicada no dia 10/05/2007 durante cobertura do Celacom)

Discreto. Quase invisível. Eliseo Verón perambulou pelos corredores da UCPel durante os três dias do CELACOM 2007. Com ar sereno, quase indiferente, o homenageado do colóquio parecia não notar os olhares curiosos que o seguiam por toda parte.

Rumores de um mau humor congênito surgiram da platéia, a seriedade do pesquisador se tornou um signo que indicava a manutenção de uma distância segura. Mais que isso, a fama de intelectual dos intelectuais tornou o perímetro de sua figura radioativo para aqueles que desconheciam o tal argentino.

Sentado sempre na quinta fileira do auditório central, o homem tão esperado parecia esquecido entre os ouvintes e, assim como eles, escutou atenciosamente sobre Internet, Freire, América Latina, Antônios e formatos.

Mesmo quando o barulho de marteladas e serras invadiu uma das exposições, o olhar de Verón se manteve fixo ao palestrante. Uma concentração quase inabalável, uma expressão quase congelada.

Com sobrancelhas arqueadas e cabelo branco algodão, o renomado homem da comunicação latina causou tremor e algumas horas de nervosismo naqueles que o entrevistaram, mas também garantiu cadeiras lotadas e transmissão ao vivo quando subiu ao palco.

No último dia, na última hora do congresso, ele, o grande homenageado, sentou sozinho frente ao público para falar por si. Depois de uma mesa de Doutores discutindo sua obra, Verón se dirigiu vagarosamente à mesa de explanação.

Sem qualquer falsa modéstia agradeceu aos responsáveis pelo CELACOM e prometeu não se alongar. “Há o jogo de futebol às dez”. Naquele momento, o homem distante e calado que cruzava pela UCPel estava, despretensiosamente, arrancando risos da platéia.

E assim foi. Durante os poucos minutos que ficou sob os holofotes, o grande homenageado se comunicou de forma simples, objetiva e descontraída. Provando que, além de inovador, Verón também é surpreendente.

Ao contrário de alguns Doutores, o argentino falou aos acadêmicos, reduziu seu próprio tempo de verbalização e cativou os expectadores com um discurso horizontal e agradável.

Mais uma vez Eliseo rompeu paradigmas e desconstruiu, através da simplicidade, uma idéia já formada. A imagem dura de Verón mudou no imaginário dos ouvintes após poucos minutos de palestra.


A estrela do CELACOM se manteve apagada até o momento exato de brilhar e, quando o fez, foi aplaudido de pé pelos olhos curiosos que o seguiram durante os três dias de congresso.

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QUEM FOI? Verón formou-se em Filosofia na Universidade de Buenos Aires em 1961, após o que foi aluno de Claude Lévi-Strauss na França, quando estudou no Laboratório de Antropologia Social do College. O argentino se tornou referência da semiótica com sua teoria da "semiose social", que desenvolveu após afastar-se da semiologia saussuriana, a mais aceita até esse momento nos estudos de comunicação social. Após duas décadas de carreira no exterior, retornou ao país em 1995, onde foi catedrático em várias universidades. Além disso, foi docente na Universidade de Buenos Aires, onde sua obra é parte fundamental na disciplina de Ciências da Comunicação, e na Universidade de San Andrés, na qual dirigiu o mestrado em Jornalismo até 2006 (FONTE: site R7).

terça-feira, 3 de maio de 2011

CASAMENTO REAL x OSAMA


Alguém que sigo no Twitter (meu segundo lar, diga-se de passagem) disse que nestes últimos dias o mundo vivenciou uma história digna do universo encantado de Wall Disney. O twett desta pessoa, sobre a qual não estou tentando criar nenhum mistério simplesmente não lembro quem é,  dizia algo como: O príncipe casou com uma linda plebéia e, após tantas lutas, o vilão foi morto pelo mocinho. É isso mesmo? por favor me digam ... estamos mesmo vivenciando um momento histórico que contaremos com uma enorme nostalgia e alegria aos nossos netos? bom, pra variar não estou muito convencida e confiante nessa euforia ocidental. 



Pra início de conversa acho que a relação entre o casamento real e a morte de Osama Bin Laden será sempre incompatível ... principalmente quando pensadas sobre o prisma das emoções que despertaram. A meu ver, o casamento do Príncipe inglês acendeu uma chama de encantamento nas pessoas, elas pararam tudo que estavam fazendo para acompanhar cada detalhe da construção do cenário em que seria encenada a mais nova história de amor do mundo. Nela, há todos os elementos que compõem um típico conto de fadas ocidental: um príncipe que teve uma triste trajetória na infância e, por fim, se apaixona por uma linda e carismática plebéia, uma rainha misteriosa e controversa, uma família real com uma extensa trajetória de intrigas, desastres, escândalos e, ao mesmo tempo, magia e aura de poder.  Cá entre nós, não é o enredo mais original do mundo e nem o que mais me agrada, mas ainda assim funciona, e funciona muito bem. Não, não é ironia. Acredito honestamente que o casamento real despertou algo positivo nas pessoas, de alguma forma elas se envolveram, se permitiram sonhar e compartilhar o súbito clima de romantismo e festejo que se espalhou pelo ocidente. A história toda foi como uma fuga em massa da realidade cinzenta para um universo de encantamento no qual os finais felizes são possíveis. O casamento de tornou um refúgio para aqueles que o excesso de realidade já havia secado, definhado ... uma esperança. E isso é ótimo! 

Mas então, chegamos ao ponto com o qual não consigo concordar. Nesta segunda-feira, os sites de notícia do mundo inteiro começaram a divulgar a notícia de que Osama Bin Laden estava morto. O cara do 11 de setembro havia morrido. Ok. Tudo bem. As informações foram chegando, as notícias se acumulando até que eu parei um segundo e percebi que algo estava muito errado ... "Peraí", em primeiro lugar ele não foi morto e sim assassinado ... não, não é a mesma coisa e ... SIM, isso faz toda diferença. Alguém consegue imaginar que, caso o Obama fosse morto em um ataque idealizado por Bin Laden, algum jornal utilizaria o termo MORTO no lugar de ASSASSINADO? ... É claro que não estou aqui defendendo o Osama Bin Laden, muito menos validando nenhuma de suas ações ... na verdade estou mesmo preocupada com o espetáculo que sua morte se tornou. Em poucos minutos após a confirmação do fato, americanos saíram às ruas para comemorar, beber e festejar como se tivessem ganho alguma final de campeonato. Pessoas de todos os países, principalmente os ocidentais, mandavam mensagens pelo Twitter festejando o que, a meu ver, foi mais um derramamento de sangue em uma sociedade doente e ainda medieval. 

As manifestações após a morte do, então dito, maior inimigo do ocidente trouxe consigo não o sentimento de encantamento gerado pelo casamento real, mas um clima de libertação de um ódio insaciável por vingança. As imagens pareciam as reproduções típicas do mundo antigo no qual a população clamava pelo sangue, pela crucificação e açoitamento de seus criminosos. Então é isso? é essa nossa sociedade? é isso que somos? ... Honestamente, não vejo diferença entre as ações desumanas sejam elas oriundas do ocidente ou do oriente, do norte ou do sul, do leste, do oeste ... E o que assisti foi a mais cruel manifestação de apologia à violência, aos massacres, às guerras e aos atentados, de que já tive notícias.

Alguém pode se perguntar se eu fiquei triste com a morte de Bin Laden, e respondo que SIM, eu fiquei. Assim como me entristeci com as mortes do 11 de setembro, das guerras históricas que só promovem o ódio, a discriminação e as divisões imbecis que os poderosos estabelecem e nós acatamos eufóricos. Não há o que se comemorar na vigança. Não há o que se comemorar em uma guerra. Ninguém nunca vence. A história apenas se repete e aumenta o número de corpos ... de mortos ... de futuras retaliações. Até quando isso irá durar? quanto sangue precisa ser derramado para saciar nossa sede? A humanidade, desde sempre, baseou sua história nos inúmeros conflitos que travou e, pelo que assisti e pelo que continuo assistindo, isso nunca irá mudar. A humanidade promove e celebra a violência, mesmo sabendo que ela será a única vítima do terror que gera.

Ao meu colega de Twitter, sinto informar que o final feliz esperado por ele não parece próximo. Existirá apenas na imaginação dos plebeus que sonham com o mundo encantado de Wall Disney ou com príncipes, princesas e seus castelos ... No mundo de verdade a felicidade parece sempre estar mais distante de nós do que nosso próprio fim.