Eu poderia ter uma mansão com piscina olímpica, ser chefe de uma grande empresa
ou mesmo uma mulher admirada por muitos e com uma recheada conta bancária, mas
a verdade é que nada disso poderia ser tão grandioso quanto as lembranças
daquele chalé rosa de esquina e dos seres mágicos que passaram por lá durante
minha infância.
O pequeno castelo dos meus poucos anos de vida não
tinha muitos metros quadrados, mas possuía um jardim encantado, cultivado pelas
mãos de uma senhora bondosa e iluminada, alguém que meus pais me ensinaram a
chamar de “vó”. Àquela pequena grande mulher sempre teve o riso frouxo e mãos
de fada que transformavam as fazendas do balaio de palha em vestidos e casacos.
Pura mágica para uma criança que tentava seguir seus pontos alinhavando
pequenas vestes às bonecas guardadas, cuidadosamente, à terceira gaveta da
cristaleira.
Durante todos os dias do ano as portas do chalé
permaneciam abertas. Lá de dentro saía um cheirinho de comida capaz de dar
inveja aos grandes chefes. Mas o encanto do pequeno reino da minha infância
ficava ainda mais luminoso durante o fim de ano. À esta época, o lugar
tornava-se acolhida a quem chegasse, eram tios e tias, primos e primas ...
todos transitavam pelos cômodos e enchiam o chalé de vida.
Meus grandes heróis (meus pais), me deixavam desbravar
todos os cantos do pátio (que parecia imenso ao meu olhar); lá eu construía
castelos de areia, piscinas de lama, túneis que imaginava poder me levar a
outros mundos. Foi ali, em meio à terra e à sombra do pessegueiro, que aprendi
a fazer e compartilhar meus primeiros “bolos de areia”, todos saboreados com
minhas primas. Foi naquele pequeno pedaço de chão que catei frutas do pé e que,
principalmente, comecei a sonhar e construir meu próprio mundo.
As fronteiras do reino de minha vó sempre tiveram
grades baixas, convidativas. A cor rosa passou a ser minha preferida;
provavelmente, uma forma de alusão inconsciente àquele recanto familiar. É doce
e reconfortante lembrar daqueles anos: o suco de laranja matinal, as histórias
que ouvi sentada no degrau da cozinha comendo, despreocupadamente, uma enorme
fatia de melancia. Como as frutas pareciam doces na casa da minha avó.
É possível que ninguém tenha percebido o quanto aquelas
paredes me eram preciosas. Talvez nenhum dos seres encantados soubesse que eu
os guardava como um tesouro. É provável que, até hoje, eles não saibam que um
dia foram mágicos aos olhos de alguém que estava aprendendo a dar seus
primeiros passos à descoberta do mundo. Seja como for, a verdade é que, mesmo
de forma não declarada, terei cada um deles sempre comigo, manterei na minha
mente a imagem criada há tantos anos por àquela garotinha.
Mesmo que hoje o chalé rosa não pareça tão grande e que
já não haja as esculturas de areia na sua entrada, toda vez que eu voltar naquele
lugar e me deparar com minha avó e seus trejeitos, terei a certeza de que ali
está o maior e mais belo lugar do mundo. Embora eu já saiba que os seres que
ali passam não são mágicos ou encantados, descobri que são bem mais ... eles
são minha família, são as pessoas que me ensinaram a amar e a viver de forma
digna e majestosa, seja em grandes palácios, seja em um pequeno chalé rosa perdido
em alguma esquina de uma cidade do interior.
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